As velhas que são novas histórias.... Diários das Terras de Cavaleiros II




Ainda pelos planaltos das Terras de Cavaleiros, eu e Mizegui tiramos um dia para visitar um velho Ermita de Brar, Fern Brama.

Fern era um viajante de sempre. Em tempos a sua missão havia sido ser mensageiro da Ordem dos Cavaleiros do Poder, levando as mensagens de povoação em povoação, dando a conhecer ao todo o que só a alguns era permitido.

Encontra-mo-nos à entrada da gruta onde habitava Fern, bem no sopé de uma das muitas montanhas de Brar, muitos vales abaixo da Fortaleza de Algor e com uma paisagem deslumbrante. Mesmo à frente da gruta erguiam-se as Lagoa de Azis, um imenso espelho azul polvilhado de pequenas ilhas onde habitavam outros Ermitas que também haviam tido responsabilidades na Ordem dos Cavaleiros do Poder.

Fern preparou-nos Javali. Mizegui ainda resistiu devido às suas  fortes convicções sobre o balanço e equilíbrio com Gaia, a Mãe de tudo o que é natural e puro, mas acabou por ceder. Já havia provado javali mas aquele estava estranhamente bem cozinhado e apetitoso.

Há volta da fogueira as conversas fizeram com que perdêssemos a hora até que Fern voltou a falar sobre os seus filhos e a distância a que ambos se haviam votado, por força das escolhas de vida que ambos haviam feito:
- Lamento não ter estado mais presente na vida dos meus filhos. A vida de mensageiro deu-me quase tudo, mas tirou-me quase tudo. Hoje sobram-me as minhas orações, as minhas meditações e os amigos de sempre.- refletia Fern
- Não sei o que é ser pai, nobre Fern, mas sei o que é ser filho. A partir do momento em que nos conhecemos em consciência e que a infância passa a ser apenas um estado de espírito a responsabilidade deixa de ser uma via de um sentido, passa a ser um caminho percorrido por ambos os sentido. Neste momento, a quem assenta a maior responsabilidade? - questionei-o
- Não se trata de responsabilidade meu amigo. Trata-se das barreiras e muros invisíveis que ergues dentro do teu coração. Há dias em que passamos uns pelos outros e fingimos que nem nos conhecemos. Ficamos há espera do milagre do discernimento e que algum de nós tome a iniciativa. Chega a uma altura em que parece que o universo escolhe por nós e que o muro invisível chega parecer real. - respondeu com voz perturbada.
- Não te quero por em causa, mas o que diz o teu coração? - voltei a questionar.
- Já nem sei bem. Já fui atrás da nossa relação, voltei a tentar ligar o que somos, mas pura e simplesmente eles não deixam que chegue até eles. Já não consigo ler de quem é a responsabilidade. - lamentava-se.
- Somos finitos e limitados e não temos de ter coração e sabedoria para todos os desafios que nos são colocados. Isso não significa que não continuemos de coração aberto. Fern, a história diz-nos que da maldição mais rebuscada pode vir a maior das bênçãos. Da inimizade mais estranha pode vir o maior dos aliados, do caos poderá nascer a solução nunca sonhada. Volta ao treino, mantém os sentidos alerta e deixa o teu coração continuar falar...